E no entanto o país, meu Senhor,
é uma beleza! Uma beleza! Encantador!
Trinta portos ideais, um céu azul marinho,
A melhor fruta, a melhor caça, o melhor vinho,
Balsâmicos vergéis, serranias frondosas,
Clima primaveril de mandriões e rosas,
Uma beleza! Que lhe falta? Unicamente
Oiro,vida, alegria, outro povo, outra gente.
Raça estúpida e má, que por fortuna agora
Torna habitável este encanto…indo-se embora!
Deixe morrer, deixe emigrar, deixe estoirar:
Dois boqueirões de esgoto,- o cemitério e o mar.
Que precisamos nós? Libras! Libras, dinheiro!
Libras d’oiro a luzir! Onde as há? No estrangeiro?
Muito bem; o remédio é claríssimo, é visto;
Obrigar o estrangeiro a tomar conta disto.
Impérios d’além-mar, alquilam-se, ou então
Sorteados,- em rifa, ou à praça,- em leilão.
E o continente é dá-lo a um banqueiro judeu,
Para um casino monstro e um bordel europeu,
Fazer desta cloaca, onde a miséria habita,
Um paraíso por acções,-cosmopolita.
…………………………………………….
Pátria
(1896)
Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na politica portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do país, e exercido ao acaso da herança, pelo primeiro que sai dum ventre, como da roda duma lotaria.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgamando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar.
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