domingo, março 21, 2010

Dia da Poesia


As folhas da cerejeira


A André Tarkovsky


Por cima de Casteldeci há uma igreja sem tecto e as paredes têm

entre os braços uma cerejeira que cresceu no chão e cujos ramos

tocam o céu.

Em Abril floresce e a brancura desliza da árvore até ao fundo do

vale, depois nascem os frutos e comem-nos os melros e os pássaros

bravos; entretanto as folhas ficam vermelhas e uma de cada vez caem

ao chão.

Se alguém assoma àquelas paredes com o desejo de pedir um

milagre e há uma folha que cai nesse momento é sinal que de lá de

cima terá uma resposta boa.

Tarkovsky passou lá em Novembro e precisa de fazer um

pedido grande, mas as folhas já tinham caído todas e serviam de

cama a duas ovelhas que dormiam.



Tonino Guerra

O Livro das Igrejas Abandonadas


O Crescimento do Amor, ou a Primavera

Mal acredito que o meu amor seja tão puro

Como pensava que era,

Porque tem que suportar

Vicissitudes, e estações, como a erva.

Penso que menti todo o Inverno, quando jurava

Meu amor infinito, se a Primavera o aumentou.

Mas, se o amor, este remédio, que toda a mágoa cura

Com mais, não for qualquer quintessência, é mistura

De todas as matérias afligindo a alma, ou os sentidos,

E ao Sol rouba o seu vigor operativo.

O Amor não é tão puro e abstracto, como costumam

Dizer os que por amantes têm a sua Musa,

Mas como tudo o resto, sendo também elemental,

Por vezes será contemplativo, outras agirá.

Mas nem por isso maior, apenas mais eminente

Se tornou, com a Primavera

Como, no firmamento,

Com o Sol, as estrelas, se mostram mas não aumentm.

Como botões num ramo, ternos gestos amorosos,

Da despertada raiz do amor florescem agora.

Se, no agitar da água mais círculos procedem

De um, também assim o amor se acrescentará.

Esses, iguais às tantas esferas, apenas um céu formam,

Porque todos são concêntricos em ti:

Cada Primavera acrescentará novo calor ao amor, e

Como os príncipes em tempo de guerra, que lançam

Novos impostos sem depois os revogar na paz,

Nenhum Inverno diminuirá o acrescento da Primavera.

John Donne

Poemas Eróticos

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